20150617

"Diziam-me: é preciso substituir a tralha do PS"

 
Durou apenas cinco meses à frente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro. Este professor de robótica no departamento de Engenharia Mecânica da Universidade de Coimbra, de 48 anos, dá um testemunho sobre o que foi resistir às pressões partidárias. "Ninguém quer que você pense em nada", denuncia. Foi do PSD. É vereador da oposição na câmara de Condeixa. Depois de tudo o que viu, desfiliou-se. Eis o depoimento de Norberto Pires na íntegra. Na primeira pessoa:

"O primeiro choque que tive ao chegar à Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional Centro (CCDR) foi quando percebi que ninguém quer que você pense nada, nem que organize equipas. Querem apenas alguém que mantenha o status quo e que distribua o dinheiro.
Antes de assumir as funções de presidente da CCDR, no início de 2012, eu era presidente do conselho de administração do Iparque de Coimbra, um parque de ciência e tecnologia que tem como objectivo instalar empresas e atrair investimento estrangeiro e nacional. No fundo, é um acelerador de empresas. Sou professor de robótica no departamento de Engenharia Mecânica da Universidade de Coimbra.
O convite para a CCDR apareceu de forma difusa. Houve uma intervenção do primeiro-ministro, pois eu conhecia vagamente Pedro Passos Coelho antes chegar ao Governo, como apoiante das suas candidaturas. Sondaram-me na sequência do meu trabalho no Iparque e quem me nomeou foi a ministra Assunção Cristas. Durou apenas cinco meses, de Fevereiro a Julho de 2012. Nunca tinha tido cargos políticos, apesar de ter feito parte da comissão política distrital do PSD em Coimbra, com as minhas opiniões muito próprias. Filiei-me no PSD um dia depois de José Sócrates ganhar as eleições em 2005. Saí do partido em Dezembro de 2014.
Sempre recusei recrutar pessoas por causa da filiação partidária na CCDR, apesar de o partido o exigir. Queriam que eu demitisse Ana Abrunhosa, uma socialista que era vogal do Mais Centro, a entidade responsável pelo QREN [fundos europeus], que também dependia de mim. Quando entrei devem ter pensado: aquele tipo nomeado pelo PSD é um boy e faz o que o partido manda. Não foi assim.
Não conhecia isto na sua verdadeira extensão. Não é a corrupção. É uma certa influência que Lisboa tem sobre as pessoas e os cargos. O próprio Almeida Henriques, então secretário de Estado da Economia [seria depois eleito presidente da câmara de Viseu], exigia a demissão dela. Havia nomes sugeridos, soprados por terceiras figuras. Fui encontrá-la num gabinete asséptico. Já tinha arrumado tudo. Conversámos. Antes disso falei com o primeiro-ministro por SMS. Disse que não concordava com a demissão da senhora. Era absurdo. Ela era a responsável pelo QREN desde 2008, era a gestora principal do programa quadro. Se matássemos tudo o que lá estava, ficávamos sem histórico. O primeiro-ministro achou sensato. Mas a relação não correu bem. Ela acabou por me trair.
As pessoas têm de ser competentes, mas há uma regra: têm de ser leais. Das duas primeiras pessoas que nomeei, uma tinha estado ligada à Juventude Comunista e a outra era casada com um dos dirigentes do Bloco de Esquerda na região centro, o José Reis, que chegou a ser secretário de Estado do PS. Ela era a pessoa que mais trabalhava e que tinha ideias. Pu-la a coordenar o grupo de investimento do centro. Considerava aquilo fundamental. Foi um choque frontal com o status quo do partido. Quando entra um tipo conotado com uma área política, estão à espera que substitua toda a gente. Quando isso não acontece é anormal e as pessoas ficam desconfiadas. Nas instituições públicas os funcionários estão à espera da alternância nos lugares conforme o partido que está no poder.
As CCDR são encaradas como prateleiras. Encontrei pessoas com enormíssima competência ao nível estatístico ou na gestão do território, tudo emprateleirado. O que os partidos querem é tirar todas as direcções de serviços e meter novas, da sua cor. Não organizei nenhum concurso para as direcções de serviços e mantive as pessoas que já lá estavam. Ainda não havia lei-quadro [que define a estrutura das CCDR]. Quando a lei-quadro entrasse em vigor, caíam as direcções todas, mas, entretanto, enquanto estavam em funções, eu podia avaliá-las. No partido, achavam que era o momento de se fazerem as substituições porque depois quando fosse o concurso essas pessoas já tinham experiência para serem nomeadas. É uma forma de viciar os concursos. Diziam-me: "Só os outros é que são bons? Nos nossos não há ninguém que seja bom? É preciso substituir a tralha socialista..."
Havia lá os socialistas que foram nomeados politicamente e que saíram com as equipas de topo. Os que são funcionários das estruturas têm medo. Tive traições de pessoas que passavam informação. Quando desconfiava de alguém, passava-lhe informação e depois via quem era o responsável pela fuga. Mandei embora uma pessoa por causa disso. Passei a estar na mira da sede nacional do partido. Afinal quem é este gajo que não faz o que lhe mandam? Não aprovei certos projectos que cheiravam a esturro. Quando me pareciam estranhos, não os metia na agenda e empalhava. Chocou com enormes interesses, até de ministros…
A certa altura, quando o Governo estava a reduzir o número de Centros de Saúde e a refazer o mapa judiciário, o ministro-adjunto Miguel Relvas pediu um mapa das infraestruturas do Estado. A ideia de racionalização era boa, para haver uma partilha entre os concelhos. Eu decidi sugerir também a localização dos parques de ciência e tecnologia e dos parques industriais abandonados. Fomos apresentar o projecto no Conselho Regional do Centro [onde estão representadas as autarquias, empresas, universidades, etc.], que na época era presidido pelo Álvaro Amaro, então presidente da câmara de Gouveia.
Cinco minutos antes de começar, já eu estava sentado na mesa, recebo um telefonema do chefe de gabinete do secretário de Estado Afonso Paulo [do Ambiente] a dizer que estou proibido de apresentar o projecto Invest Centro. Mas porquê? Porque estas coisas tinham de ser coordenadas com o secretário de Estado. Eu digo que estou a cinco minutos da apresentação. E o chefe de gabinete diz: isto é uma ordem directa. O Almeida Henriques estava ao meu lado. Disse-lhe. E ele também mostrou desconforto.
Desobedeci. Achei que isto se enquadrava nas estritas competências das CCDR. Só não assinei os protocolos previstos com o AICEP porque tinha recebido uma ordem directa, mas apresentei o projecto. Não conhecia o poder dos chefes de gabinete. É um poder à parte. Comunicam todos uns com os outros.

Certa vez apareceu-me um presidente de câmara acompanhado por um empresário brasileiro que tencionava construir um hotel numa zona de reserva, o que implicava um estudo de impacto ambiental, com um campo de golfe com mais buracos do que o permitido. Foram pressionar-me para dar andamento ao processo, porque era um investimento que se ia perder. Eu disse que havia leis e regras a cumprir. O brasileiro explicou que precisava de um compromisso e eu respondi que não reduzia a qualidade nem a assertividade da avaliação. Reduzia os prazos ao mínimo legal de 60 dias, garantindo a assertividade máxima. O presidente da câmara contorcia-se. Não abriu a boca durante a conversa e estava constrangido. Aquilo era essencial para ele, um investimento que podia decidir eleições. Fez um papel um bocado triste. Para contornar o excesso de buracos no campo de golfe, o brasileiro argumentava: "Dividimos aquilo em quatro ou cinco campinhos e depois junta-se tudo". Eu disse-lhe: "O senhor é um artista". E ele respondeu: "Isto não tem nada de ilegal." Não queria acreditar: "Então o senhor não vê nada de ilegal nisto?" O projecto acabou por ter um estudo de impacto ambiental negativo.
 
Nessa época, outro artista chamado Rogério Gomes, que tinha criado o Instituto do Território [e agora é presidente do Gabinete de Estudos do PSD] que é uma coisa privada, não é um instituto, andou a dar entrevistas a dizer que as CCDR eram um buraco negro, um bando de incompetentes. Uns dias depois, Pedro Santana Lopes daria uma entrevista mais ou menos a dizer o mesmo. Então, escrevi um artigo no Público a responder. Recebi um telefonema do chefe de gabinete da ministra [Assunção Cristas] a dizer que posso escrever artigos, mas antes precisam de validação superior. Quando dei outra entrevista ao Jornal de Notícias a falar dos objectivos para a região centro, também recebi um telefonema do chefe de gabinete da ministra a dizer a mesma coisa. As minhas entrevistas causavam desconforto e tinham de ser coordenadas. Tinha de pedir autorização para dar as entrevistas. Penso que a reacção nem era da ministra, mas de outros secretários de Estado incomodados com o meu protagonismo.

Entretanto, apareço no Prós-e-Contras e não comuniquei que ia. Fui de forma pessoal, para falar da experiência do Inovparq e de inovação. Não ia em funções de CCDR nem aparecia o cargo no ecrã. Deu um brado enorme e recebi vários avisos a dizer que tinha intervenções que desagradavam aos membros do Governo.
Entretanto, houve uma cerimónia de assinatura pública, em Évora, do primeiro contrato assinado com o Jessica Holding Fund, que financia projectos de reabilitação urbana e de actividades económicas em cidades. Quando ia no carro, ligou-me o chefe de gabinete do secretário de estado Almeida Henriques a perguntar se eu podia enviar ao secretário de Estado as notas do que ia dizer, para não lhe tirar os soundbites. Então mandei as notas que ainda estava a preparar por SMS. Mas ele voltou a telefonar e a dizer que o secretário de Estado falava primeiro e depois eu. Até me ofereci para não falar, não havia problema. Quem fecha os eventos são os membros do Governo. Ele disse-me aquilo que o secretário de Estado ia dizer. Tudo bem. Acordo total. Mas houve um percalço e eu e o meu motorista enganámo-nos no local. Atrasámo-nos uns 15 minutos. Quando chegámos, o secretário de Estado já estava a falar.
Acho que ele decidiu falar primeiro para dizer as coisas todas antes. Houve mais telefonemas sobre protocolo, se ele se sentava à direita ou à esquerda... Fico onde vocês quiserem, disse eu.
Só que quando entro na sala ele já está a falar. Olho para a mesa e não vejo nenhum cartão com o meu nome. Faço-me de idiota. Vou para a mesa e sento-me no lugar onde dizia "Almeida Henriques". O homem ficou a olhar para mim. Deram de imediato a cerimónia por encerrada, porque ele não tinha sítio onde se sentar…
O Governo tinha nessa época a troika e o emprego em queda livre. Criaram então um programa para o emprego jovem e não havia dinheiro. Onde havia verbas era no QREN e já estavam em grande parte comprometidas. Era necessário fazer uma operação de limpeza de projectos que não tinham viabilidade para libertar os fundos. Ganhei um conjunto de inimigos ao tirar projectos a docentes universitários que não me perdoam. Analisei os contratos todos. Os presidentes das câmaras começaram a ver as coisas mal paradas para as eleições. Alguém tinha de assumir isto politicamente. Então, o secretário de Estado Almeida Henriques veio reunir-se com os 101 presidentes de câmara da região centro. Os autarcas mostravam algum desconforto por estarem a perder projectos.
A decisão política tinha de ser apresentada aos presidentes de câmara por Almeida Henriques. O que que fiz foi acertar com o secretário de Estado, antes da reunião, o que ia ser dito, para não haver surpresas e para nos coordenarmos. Chegou muito atrasado. Mais de uma hora. Por sugestão do chefe de gabinete, começou-se antes.
Quando Almeida Henriques chegou, como já estávamos a trabalhar, pedi ao vice-presidente da CCDR para o ir buscar à porta. O homem ficou pior do que estragado e fez saber a toda a gente que eu não o tinha ido receber. Também havia de sair nos jornais que eu tinha desrespeitado um secretário de Estado em termos protocolares.
Todos os presidentes de câmara estavam a fazer críticas. Até que o Álvaro Amaro, de Gouveia, se vira para nós e diz: "Tudo bem, acredito que as coisas estão a ser feitas desta forma. Mas livrem-se, livrem-se de me estar a enganar, que eu dou-vos um tiro, a si e ao secretário de Estado". Foi em tom jocoso, não era a sério.
Depois de o secretário de Estado intervir, eu digo que gostava de falar. O chefe de gabinete tem pressa. Abro o computador e projecto uma imagem de um quadro com as contas, para mostrar quais eram as consequências para a região e para determinados projectos, com um pequeno resumo. As pessoas tinham de ter consciência das consequências. O discurso do secretário de Estado era que tudo seria muito pacífico e que eu ia depois fazer com eles o trabalho de filigrana. Eu disse que fazia o trabalho de filigrana, mas as consequências seriam aquelas. Elencava os projectos que caiam. O secretário de Estado tentou abreviar aquilo, foi uma atrapalhação para eu não mostrar. Saiu mais uma vez irritado comigo. A reunião terminou sem mais discussão.
Enviei esse relatório a muita gente, ao primeiro-ministro, ao ministro da Economia, ao ministro da Ciência, a uma série de secretários de Estado de várias áreas. É de alguma maneira uma forma de ultrapassar o superior hierárquico.
Cerca de uma semana depois, a ministra Assunção Cristas chama-me para uma reunião. Quando vou a caminho de Lisboa, tento falar com o primeiro-ministro. Envio então uma mensagem a dizer que que vai acontecer a demissão. Telefona-me o chefe de gabinete do primeiro-ministro a dizer que que ele quer falar comigo, mas está na reunião com o Presidente da República. Ia ligar-me mais tarde, mas não ligou.
Passei duas horas à espera na antecâmara do gabinete da ministra. Não fiz mais nenhum contacto. Quando ela me recebeu, teve um lapsus liguae: tinha falado com o ministro-adjunto [Miguel Relvas], aliás, com o primeiro-ministro. Disse que as coisas são como são e que chegaram à conclusão de que eu não era a pessoa certa e que esta relação tinha chegado ao fim. Respondi que naquele dia não havia nada que me aborrecesse. Só tinha recebido dois telefonemas: um do chefe de gabinete do PM e outro da minha mulher a dizer que estava grávida…
Combinei que enviaria o pedido de demissão mal chegasse a Coimbra. Foi o que fiz. Entretanto seria nomeado para presidente da CCDR Centro o Pedro Saraiva [que será o deputado relator da comissão de inquérito do BES], que se demitiu quando foi decidido que estes lugares iam ser avaliados pela CRESAP e ele era contra. Achava que devia ser por nomeação e voltou ao Parlamento. Eu decidi concorrer ao lugar, porque queria demonstrar que era assim que se deviam nomear as pessoas. Os três seleccionados foram Ana Abrunhosa, António Queiroz… e eu. Mas foi nomeada a Ana Abrunhosa, que acabou por ser defendida pelas mesmas pessoas que antes exigiam a demissão dela.
Um ex-presidente de uma CCDR perguntou-me porque é que concorri e disse que entre os três era fácil escolher. "Tu saíste em choque. O outro [António Queiroz] tinha um problema [com a insolvência de empresas]. A única hipótese era ela". Ainda me disse que eu, ao concorrer, tinha tirado a possibilidade de um boy do PSD estar entre os três finalistas e ser escolhido. Uma das pessoas que eles queriam colocar terá ficado em quarto ou quinto lugar.
Hoje não recomendo a ninguém ser militante de um partido. São sítios de maus costumes. O que se aprende é que tendem a gerir as coisas de forma condenável. Nada tem a ver com ética nem a nada se pode aplicar a palavra ética."
 


20150612

Lisboa, Portugal, 14 de Novembro de 2012

Para não esquecer as cargas policiais do governo PSD/CDS de Passos Coelho. Esta foi uma das piores.

20150510

Fascismo: Um perigo real a tomar a sério

 
 
Em numerosos países e de forma particular nas cidadelas do capitalismo – Europa e América – multiplicam-se e ganham intensidade as organizações, manifestações e propaganda fascista e fascizante.
 
A influência e a impunidade de que gozam não param de crescer. Algumas destas organizações alcançaram percentagens eleitorais altamente significativas. A sua influência a nível dos órgãos de poder, de forma aberta ou encoberta, acentua-se e alguns partidos neo-fascistas têm integrado governos na União Europeia.
 
Simultaneamente perseguem-se comunistas e sectores democráticos. Procura-se criminalizar o comunismo e elevar o anti-comunismo à categoria de ideologia de Estado. Limitam-se direitos dos trabalhadores e as liberdades em geral.
 
O fascismo não é coisa do passado, nem é um fenómeno episódico. A existência do fascismo tem uma base objectiva: o sistema capitalista. As expressões mais ou menos virulentas do fascismo têm a ver com o agudizar das crises do capitalismo e sua capacidade para encontrar, ou não, saídas para a crise por meios ditos democráticos.
 
O fascismo não é, consequentemente, uma forma política-ideológica separada do poder económico, que determina a natureza do poder.
 
A experiência portuguesa – passada e presente – é, a este respeito, bastante esclarecedora. Em Abril de 1974, o povo português pôs fim à mais longa ditadura fascista que o mundo conheceu. Uma ditadura fascista que ao fim de 48 anos de opressão deixou um rasto de assassinatos e dezenas de milhares de antifascistas presos e torturados. Uma ditadura que sobreviveu à derrocada do nazi-fascismo no final da II Guerra Mundial com a a ajuda determinante das chamadas democracias ocidentais – Inglaterra e América –, para quem a sobrevivência do fascismo português (e também espanhol), campeão do anti-comunismo, se lhes apresentava como aliado estratégico de particular importância.
 
Sendo o fascismo português o governo terrorista dos monopólios e dos grupos financeiros e dos agrários associados ao imperialismo estrangeiro – os grandes beneficiários da ditadura e seu suporte social fundamental – a revolução antifascista não poderia limitar-se a mudar o regime político. Teria obrigatoriamente de liquidar o poder económico do fascismo, como condição para a defesa das liberdades e do próprio regime democrático. Foi isto que fez a Revolução de Abril de 1974 em Portugal, derrubando a ditadura fascista e liquidando o capitalismo monopolista de Estado, procedendo à nacionalização de todos os sectores básicos da economia e à reforma agrária.
 
Apesar da enorme resistência ao desmantelamento do Estado fascista, resistência de fascistas e de sectores democráticos temerosos com as transformações sociais e as conquistas do movimento operário, a revolução, ainda que não tivesse ido tão longe quanto necessário à defesa do regime democrático, procedeu ao desmantelamento do partido fascista, da polícia política, das organizações paramilitares e das estruturas corporativas-fascistas. A Constituição da República Portuguesa, aprovada em 1976, consagrou a proibição de organizações e propaganda fascistas e racistas.
 
As organizações que procuraram reagrupar as forças fascistas de forma «legal» (Partido da Democracia Cristã, Partido do Progresso), ou de forma ilegal e clandestina (Movimento Independente para a Reconstrução Nacional – MIRN; Movimento Democrático de Libertação de Portugal – MDLP), que se lançaram na acção terrorista, foram derrotadas e desmanteladas.
 
Com o avanço da contra-revolução, a restauração dos grandes grupos económicos e financeiros, a subordinação dos interesses de Portugal aos ditames da União Europeia e da NATO, e a consequente degradação da situação económica e social e perda de soberania nacional, começou a proliferar a propaganda dita patriótica e nacionalista, bem como organizações ilegais e semi-ilegais – Movimento de Acção Nacional, Frente Nacional, Direita Nacional, «Skineheads» – assumidamente fascistas, adoradores de Hitler e de Salazar, combatentes anti-comunistas e racistas.
 
Organizações que, embora minúsculas do ponto de vista da adesão alcançada, levaram a cabo acções provocatórias contra forças progressistas e imigrantes, que se traduziram nos assassinatos de um activista de esquerda e de um negro cabo-verdiano (1995).
 
A partir de Abril de 2000 opera-se uma mudança qualitativa na actividade das organizações fascistas com a criação do Partido Nacional Renovador (PNR), agregador das diferentes organizações neo-nazis e sua cobertura legal, tendo nas suas fileiras assumidamente dirigentes daquelas organizações, incluindo «Skinheads».
 
Não tendo conseguido recolher as 5000 assinaturas necessárias na altura à legalização de um partido político, os neo-nazis ultrapassaram este obstáculo formal comprando a sigla e a logística de um partido desactivado e endividado, o PRD (Partido Renovador Democrático), passando a ter, deste modo, sedes, concorrer às eleições, realizar manifestações públicas e acesso a tempo de antena sob a sigla do PNR.
 
Formalmente o PNR assume-se como «partido de direita nacionalista», que tem por objectivo «a justiça social», «o combate ao capitalismo selvagem, ao comunismo e à luta de classes» e a «defesa da pátria» subordinada às ordens de Bruxelas. As suas acções práticas têm um forte cunho xenófobo e racista, reivindicando a expulsão dos imigrantes, considerados invasores da pátria.
 
Tendo como «guia e mestre» Jean Marie Le Pen e a sua Frente Nacional, mantém relações internacionais com organizações neo-nazis em quase toda a Europa. Em 2007, coincidindo com o aniversário de Hitler esteve agendado para Portugal um Encontro Internacional de organizações fascistas, que não se chegou a realizar devido à forte reacção democrática e popular contra a sua realização.
 
Sendo embora de composição social heterogénea, no PNR predominam elementos da pequena-burguesia (funcionários públicos, comerciantes, industriais, professores e jovens universitários), com nula ou quase nula expressão nos meios operários.
 
A visibilidade mediática e os meios financeiros de que dão mostra são desmedidos em relação à fraca mobilização que conseguem nas ruas e actos públicos (100/200 pessoas). Os resultados eleitorais para a Assembleia da República, apesar de pouco significativos (0,07% de votos em 2002; 0,16% em 2005; 0,36% em 2011; e 0,4% para o Parlamento Europeu, em 2009, revelam um crescimento sustentado e sendo embora pouco expressivos no universo eleitoral nacional representam, em 10 anos, um crescimento de 500%.
 
A benevolência, a impunidade e mesmo a cumplicidade de que gozam por parte dos poderes constituídos é flagrante, em contraste com as acções repressivas contra as manifestações populares de combate às políticas de direita.
 
Com excepção de algumas prisões e condenações de elementos dos «skinheads» implicados nos assassinatos de 1995, dos cerca de 30 presos da Frente Nacional/PNR apenas um dirigente foi condenado por possuir um arsenal de armas ilegais.
 
Os perigos de soluções antidemocráticas e fascistas não podem ser avaliados apenas, ou fundamentalmente, pelo número de organizações fascistas, sua influência e activismo, na medida em que estas organizações não passam da parte visível de um «icebergue» muito mais vasto, com extensões ao poder político e económico.
 
Os partidos de direita constituídos depois do 25 de Abril – Centro Democrático Social (CDS) e Partido Social Democrata (PSD) – absorveram grande número de elementos fascistas, reciclados de democratas. Ministros fascistas já integraram Governos do CDS, PSD e mesmo do Partido Socialista.
 
Destacados responsáveis do regime fascista e agentes da polícia política foram reintegrados na Administração Pública por Governos destes partidos. Cavaco Silva, actual Presidente da República, concedeu enquanto Primeiro-Ministro pensões de mérito a agentes da polícia política fascista, «por altos serviços prestados à pátria».
 
A reconstituição dos grandes grupos económicos e financeiros, a destruição das grandes conquistas democráticas, o agravamento da crise económica e social socavam a base social de apoio ao regime democrático, abrindo caminho a intensa campanha contra a política e os políticos e instituições democráticas (Assembleia da República e Tribunal Constitucional), «caldo de cultura» propício ao desenvolvimento de acções reaccionárias. Campanha esta que é acompanhada de uma outra campanha de branqueamento do fascismo, de negação dos seus crimes e reabilitação de Salazar. «Historiadores» e politólogos negam mesmo ter havido fascismo em Portugal.
 
Os sistemas de informações e repressão de Portugal, integrados num vasto e sofisticado aparelho repressivo de âmbito internacional, são cada vez mais governamentalizados e entrelaçados com grupos económicos e financeiros e, actuando à margem das instituições democráticas, assumem funções de polícia política, vigiando organizações políticas de esquerda, sindicais e manifestações populares contra a política de direita.
 
Os sentimentos antifascistas em Portugal continuam muito vivos. A palavra de ordem «Fascismo Nunca Mais» e «25 de Abril Sempre», continua a ter enorme adesão. O barrar do caminho ao fascismo exige medidas práticas que ataquem as suas causas: as políticas de direita, o poder dos grandes grupos económicos e financeiros, a crise económica e social.
 

20150111

O dia em que os portuenses evitaram que o Menezes fosse para a câmara municipal.

Um discurso que já tinha um atraso de 16 anos, mas mais vale tarde do que nunca. O Porto conseguiu evitar o despesismo e populismo fácil. Foi pena que os gaienses não tenham aberto os olhos antes e tenham mantido este indivíduo no poder, na sua câmara, durante longos 16 anos, onde tudo se gastou, tendo a autarquia ficado à beira da falência.
 
 
 

20141207

Corrupção




Uma ilusão chamada “velho PSD”

Em vésperas do 25 de Abril, um grupo de políticos afastou-se apressadamente da Acção Nacional Popular para poder reaparecer após a implantação do regime democrático sob uma nova veste. A agitação posterior revelou que a designação escolhida — Partido Popular Democrático (PPD) — não era a mais apelativa para se alçar ao poder. Por isso, a formação recém-criada foi então rebaptizada (com um erro ortográfico para todo o sempre): Partido Social Democrata (em lugar de Democrático).

Este grupo de políticos e profissionais liberais, que se uniu para representar a finança e a grande indústria, atraiu a si as forças vivas recauchutadas do Estado Novo e as camadas da população atemorizadas pelo inócuo preâmbulo da Constituição (“abrir caminho para uma sociedade socialista”): catedráticos e analfabetos, patos bravos e publicistas, chupistas do Estado e cantores-pimba, negociantes de ocasião e autoridades locais.

É esta amálgama quase obscena que permite ao PSD aparecer com sucessivas máscaras — até como pregoeiro da “social-democracia”. A verdade é que ter ilusões sobre a sua natureza só conduz a deixar a esquerda desarmada. Vê-se com alguma frequência figuras proeminentes da oposição a fazer apelos ao “velho PSD” — como o fez João Ribeiro, porta-voz do PS, numa entrevista ao Expresso na última semana (na resposta reproduzida na imagem acima).

Acontece que o “velho PSD” anda por aí em peso. Salvo a circunstância de as suas figuras se gabarem de ser mais competentes do que estarolas de Passos Coelho, que alterações de política propõem eles? Nenhumas.

Com efeito, na “Universidade” de Verão do PSD, Marcelo subiu ao palanque para serenar as hostes após o chumbo do Tribunal Constitucional, garantindo que se há-de arranjar forma de despedir os trabalhadores do Estado. Também na “Universidade” de Verão do PSD, Alexandre Relvas, o afamado Mourinho de Cavaco, atiçou, perante o olhar incrédulo dos jotinhas, os filhos contra os pais, apelando a uma total desregulação do mercado de trabalho: “é pais a viverem à conta dos filhos” [sic], disse o protegido de Cavaco. No mesmo local, Leonor Beleza retomou o apelo do Dr. Relvas à emigração dos jovens. Santana Lopes defendeu a necessidade de uma revisão constitucional para o país poder ter uma “constituição que seja neutra, que seja isenta e independente” [sic], tema agarrado por Paulo Rangel para sustentar que a Constituição tem uma “visão demasiado conservadora”.

Onde está o “outro” PSD?