20070610

O terror ideológico do PPD/PSD.

"... Perguntei isto a alguns dirigentes do PPD, em localidades entre Braga e Bragança. Sem a menor vergonha, um esclarece-me que o povo quer continuar e pode, com certeza, continuar a destruir todas as sedes dos partidos de esquerda."

"Um outro dirigente local do PPD explicou-me, com um sorriso (...) ora aqui em cima é o PPD quem representa o povo. O povo exige a demissão do presidente da Câmara comunista, que lá foi posto nas primeiras semanas da Revolução. Se não desaparecer de livre vontade, nós ajudá-lo-emos, se necessário com violência. - Com violência?, pergunto. Sim senhor, com violência! diz ele."


WALLRAFF, Gunter. "A Descoberta de Uma Conspiração - a acção spínola". Pág. 232.Livraria Bertrand.Segunda Edição. 1976. Lisboa.



Introduz-se aqui "o polvo laranja" para representar o que vem escrito mais abaixo e que relata o tratamento que o PPD/PSD faz a quem não pensa da mesma forma que os seus simpatizantes e seguidores.
O que vem relatado, passou-se há cerca de 33 anos, perto de Viseu, mas podia ter sido hoje. Custa a acreditar que este PPD/PSD, visto como um partido de direita radical, conseguiu chegar ao poder nestes anos que passaram e as perseguições que efectuou, como se pode constatar neste texto.
A ligação entre esta factualidade, narrada mais abaixo e Mafamude, é a de que este "perigoso partido de direita" governa os destinos da freguesia há 26 anos e este ano já demonstrou sinais de intolerância democrática em não festejar o dia da liberdade.
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IMPRESSÕES DE UMA VIAGEM PELO NORTE DE PORTUGAL DE UM MÉDICO DE FRANKFURT E DE UMA ESTUDANTE DE MEDICINA EM ABRIL DE 1975


Vila Nova de Paiva, com cerca de oitocentos habitantes é das maiores povoações que se situam na montanha a nordeste de Viseu, região onde a reacção é particularmente forte. Não obstante os enérgicos esforços do MFA, as ideias do 25 de Abril ainda não chegaram a esta parte do País, onde vive cerca de um terço dos portugueses.
Chegados a Vila Nova de Paiva, após uma viagem por montes românticos, não precisamos de procurar muito para encontrar a casa do comunista António Augusto Davim. A casa, de um só piso, com bandeira vermelha no telhado, destacava-se como um farol. Aqui, onde as fachadas estão cheias de cartazes do PPD. (Este partido de direita intitula-se “popular democrático”, mas acontece que os seus fundadores eram, antes do 25 de Abril, e quase sem excepção, deputados da Assembleia Nacional fascista e contribuíram, de facto, se bem que se dessem um ar de “oposicionistas”, para disfarçar a ditadura caetanista.)
O caso do professor comunista Davim fora, há pouco, relatado na imprensa lisboeta: o clero da diocese católica, os caciques locais, os membros do ex-partido fascista ANP e a imprensa regional de orientação fortemente anticomunista tinham desencadeado, “em nome da Santíssima Trindade”, uma cruzada contra o professor. Uma vez que o boicote dos alunos organizados por aqueles resultou na impossibilidade de continuar com as aulas, Davim acabou por ser saneado por causa do “repúdio geral pela sua pessoa”. Da mesma maneira a sua mulher – que até ao nascimento da filha ministrara o ensino básico gratuito aos filhos e netos dos analfabetos - foi informada de que “o assunto já não tinha interesse”, quando quis recomeçar a sua actividade, depois da licença de parto.
“Desde então estamos desempregados”, diz António Davim. É na verdade uma história incrível: dois professores sem trabalho na zona de Portugal onde existe a percentagem mais elevada de analfabetos. Contudo, os dois continuam activos depois do incidente. Embora alvos de ameaças diárias, puseram a sua casa à disposição da gente da terra, como centro de trabalho, unindo à sua volta os mais corajosos das redondezas. “Alguns já simpatizam connosco, mas não ousam dizê-lo publicamente. O terror ideológico da Igreja e do PPD é demasiado forte”, diz Davim.
Enquanto a mulher e a filhita, que tem o nome da heroína comunista Catarina Eufémia, ficam em casa, o jovem pedagogo leva-me a uma “aldeia do século XV”. Aí em Carvalha, não há luz eléctrica nem comida que chegue. As habitações são pedras colocadas umas sobre as outras, janelas quase não existem. Os escassos campos, na sua maioria arrendados, não são maiores que duas geiras e estão cercados por muros de granito. Mulheres condenadas a calar-se, vestidas de capas castanhas com capuz, que lembram o trajo dum mosteiro, passam medrosas. Num monte por cima da aldeia-caverna, contudo, uma enorme igreja branca.
Na volta, Davim dá-nos ainda alguns jornais locais. A Voz de Lamego evoca a inquisição medieval: “O comunismo constitui um ataque directo a Cristo, à sua pessoa divina e ao seu corpo sagrado. Nós dizemos que este ataque é obra de Satanás. O espírito do Mal é próprio do comunismo”, reza o referido jornal.
O casal de professores veio a resignar-se; após várias tentativas do MDLP para lhes incendiar a casa, emigraram para Lisboa em princípios de 1976.

Retirado de: "A Descoberta de Uma Conspiração - a acção spínola", de Gunter Wallraff, em colaboração com Hella Schlumberger. Livraria Bertrand.1976. Lisboa.
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